segunda-feira, 28 de novembro de 2011

DUPLA FATALIDADE


O copo de cristal ainda tem a marca do teu batom exatamente onde bebeste o último gole da vida.
Confesso que a mesa continua posta desde esse dia que saíste à pressa para entrar ao serviço.
Mal sabias que o destino pelas costas te apunhalava: o acidente fatal.
Desculpa, sei que nem o tempo, nem o meu amor, nem o beijo repenicado na boca com que te despediste te trazem de volta.
A mesa continua posta mas é como se estivesse desfeita, tal como eu, interiormente. Falta-lhe a vida, o teu toque, as flores coloridas que trazias da rua só para perfumar mais a casa à luz da nossa paixão.
Como era tudo tão perfeito!...
Como as coisas mudam num ápice. Hoje sou eu quem morre enfeitando a tua campa com essas flores.
Dessa mesa, agora destruída, resta-me os cacos dos pratos perdidos pelo chão e a faca afiada cravada no peito.
Quem cola esses cacos para formar novos pratos?
Quem me tira a dor da faca cravada no peito?
Ninguém!
Os cacos são meros pedaços míseros. Jamais serão novamente pratos.
A faca afiada permanece cá dentro.
Ainda toca a nossa música, ainda sinto o nosso cheiro húmido nos lençóis, ainda vivo do nosso amor, estou mais que amarrada a ele!
Sinto-me incapaz, insuficiente.
Sabes, o destino foi cruel!
A dor da perda é terrível que nem um grito horrendo sufocando o escuro.
Abraço-te claro, pelas boas recordações: os olhos que me contemplavam doirados, a respiração agitada, as mãos enlaçadas, o calor dos lábios num só, a tua pele envolvendo a minha, o aroma do desejo, a palavra amor, enfim, AMO-TE.
Dei-te tanto de mim que sabia sempre a tão pouco. Mas tinha mais, muito mais.
Mais que um aconchego numa noite de Inverno, mais que o incêndio dos corpos nus espreitando o luar, mais que um abraço em noites sombrias, mais… mais... que agora se resume a NADA nestas linhas dispersas ao arrepio do vento.
O meu olhar é desumano que nem criança passando fome. É um mero sem abrigo.
A toda a hora se abate a noite e desaguam rios que tudo inundam e nada lavam.
Chamo-te, entre o silêncio que me consome, chamo-te amor.
Fraquejo num aperto e tombo sempre que tento dar qualquer passo mais firme. Em vez de ir em frente na passagem de nível corro desalmadamente para trás beijando o teu retrato.
Já lá vão precisamente 365 dias desde a tragédia sangrenta que desponta em mim à agonia do Fado.
Sozinha não resisto. É demais!
Só rogo a Deus que me leve para junto de ti para construirmos o paraíso juntos.
Dou-te a mão até ao céu que está de braços abertos à minha espera.
Não escrevo mais até que me mate nesta mesa vazia onde me suicido com os fios do telefone trilhados à volta do pescoço, só para sentir o paraíso completo a dois.

(Há agora uma estrela maior que brilha no céu junto de outra que já lá habitava)

26.11.11



JAMES BLUNT – NO TEARS
-> http://www.youtube.com/watch?v=1ZoBwK7s1l0

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